sábado, 23 de maio de 2015

Turismo faz das comunidades cariocas um produto cultural

Rocinha se destaca pelas lajes panorâmicas de onde a vista é privilegiada
Antes um problema, hoje um produto cultural. Como mostra estudo da Faculdade de Arquitetura  e Urbanismo, a FAU, da Universidade de São Paulo, a USP, as favelas do Rio de Janeiro foram transformadas em locais que podem ser consumidos pela "sociedade" capitalista. E uma das formas de consumir esse produto pode ser verificado atualmente com seu uso turístico e cultural. O poder público, na impossibilidade de resolver o "problema" urbano, atuou na transformação da imagem das favelas na paisagem urbana.

Em sua tese de doutorado, a autora do estudo Izabel Cristina Reis Mendes analisou programas do governo da esfera estadual e federal; documentos do Ministério do Turismo sobre atividades turísticas em áreas de favelas; ações de ONGs que procuram desenvolver produção cultural nesses lugares; além de visitar pessoalmente algumas do Rio e fazer um levantamento dos museus; centros culturais e atividades de turismo de algumas favelas cariocas; e entrevistar moradores. A pesquisa de campo foi realizada entre 2012 e 2013.

Grande parte dos roteiros turísticos, segundo a pesquisadora, são para os turismólogos considerados como "turismos da pobreza", o que é depreciado pela população local. Mas se a atividade turística é explorada de outra forma, os morados não a julgam de forma totalmente negativa. "Eles não são contra a atividade em si, e sim como ela vem sendo executada", argumenta. E há os que são radicalmente contra este turismo.

Turismo nas comunidades


Lady Gaga, a cantora Fergie, Madonna entre outros visitaram favelas cariocas
Foi na Rocinha, uma das maiores favelas da América Latina, onde ocorreu o primeiro roteiro e o início da prática do turismo. Já o Morro Dona Marta, em Botafogo, um dos primeiros a sofrer processo de pacificação, passou a ser o primeiro também a ter um turismo oficializado pelo poder público. Mas, segundo Izabel, os benefícios não chegaram aos moradores. "A proposta inicial era de que os guias seriam da comunidade e bancados pelo Governo do Estado, mas atualmente nem todos são. As oficinas para treinamento, vistas inicialmente como uma oportunidade de trabalho, não atenderam às expectativas. Alguns moradores relataram constrangimento com este roteiro, como se fizessem parte de um 'zoológico humano' criado para os visitantes". Vale registrar que foi lá que o astro pop Michael Jackson esteve em uma de suas idas ao Rio. Como homenagem à visita, uma praça local leva o seu nome.

Já a Rocinha tem todos os recursos de um bairro convencional: bancos, agências de turismo e diversos outros serviços. Há roteiros de turismo pela favela, operados por empresas externas com guias da comunidade. 


Elevador panorâmico leva ao Mirante da Paz, no Cantagalo
O morro do Cantagalo, em Ipanema, conta com elevador panorâmico e estação de metrô e um circuito de ruas e becos com grafites criado especialmente para o roteiro de turismo. No Complexo de favelas do Alemão, onde foi instalado o teleférico há vários roteiros especializados. Um deles, é o Roteiro do Príncipe, em referência a visita que o príncipe Harry, da realeza britânica, fez ao local em 2012. No bairro do Catete, a favela Tavares Bastos abriga a casa noturna The Maze, local muito frequentado por turistas estrangeiros, cuja língua predominante é o inglês. A favela da Maré possui um centro cultural e um museu.

As favelas menores apresentam certa peculiaridade. Um morador recebe um hóspede em sua casa para este passar alguns dias na favela e vivenciar o cotidiano local. Segundo Izabel, há relatos de um turista que ajudou uma moradora a construir uma horta orgânica; "Houve uma troca. Bem diferente do turista que sobe o morro apenas para tirar fotos".

A conclusão da pesquisadora é que algo inédito na historia das favelas acontece nos dias de hoje, pois elas estão sendo enxergadas como parte das cidades. Apesar dos problemas, passaram a ser integradas à estrutura urbana de outra forma, ainda que o consumo da favela por meio do turismo seja questionável.

Fonte: Site da Universidade de São Paulo
Foto: SiteBarra

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