terça-feira, 25 de agosto de 2015

Crise hídrica ou de gestão?

Não fosse pela sua poluição, represa Billings poderia
abastecer cerca de 4 milhões de pessoas
Seria correto dizer que a Região Metropolitana de São Paulo vive há meses a pior crise hídrica das últimas décadas? Não. É o que acredita o professor Luis Antonio Bittar Venturi, do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo, a USP. Para ele, falar em escassez hídrica é um erro, assim como culpar a falta de chuvas pela crise. "Ao contrário do senso-comum, a água não é recurso finito, pelo contrário, trata-se do recurso mais abundante do planeta", explica Luis Antonio.

Mas por que as torneiras estão secas? Segundo ele, ocorreram dois problemas de ordem gerencial: poluiu-se os recursos hídricos disponíveis e não se desenvolveu capacidade técnica para despoluir numa velocidade suficiente para atender a demanda. Apenas a represa Billings teria água suficiente para abastecer mais de 4 milhões de pessoas, mas é subutilizada pois está poluída. "Quando se abre a torneira e não há água, a causa é sempre gerencial", enfatiza o professor.

Com pós-doutorado na Universidade de Damasco sobre recursos hídricos, com foco na bacia do rio Eufrates e na produção de água nas usinas dessalinizadoras, o geógrafo Luis Antonio, através de sua experiência na Síria, explica que não se pode considerar apenas a água doce, destacada do ciclo hidrológico, já que ela advém, na quase totalidade, dos oceanos via evaporação e precipitação. "Enquanto a terra girar, o sol brilhar e a lei da gravidade estiver vigorando, as recargas de água no continente estarão asseguradas. Não há como interromper o ciclo hidrológico. E o que existe de água doce disponível na superfície e nos subsolos é muito mais do que a capacidade humana de utilizá-la. Só os cerca de 110 km³ de água que precipitam nos continentes anualmente já seriam suficientes para abastecer a humanidade". Para ele, o que é finita é a capacidade do homem de captar, tratar e distribuir a água para assegurar o abastecimento. "É um absurdo dizer que a crise hídrica de São Paulo é causada pela falta de chuva, sendo que temos enormes reservatórios subutilizados", adverte.

No caso do Cantareira, o que acontece é que as represas que compõem o sistema estão secando porque se tem usado a água num ritmo muito maior do que o das recargas naturais. Se os seis sistemas fossem mais equilibrados em termos de oferta e demanda de água, isso não ocorreria. Medida que o governo estadual passou agora a implementar. "Aí a mídia mostra represas secando para ilustrar a ideia de que a água vai acabar. Pode até acabar na sua torneira, mas não por falta dela, e sim por incapacidade de se assegurar o abastecimento.

Água, u um recurso renovável?

Para o geógrafo, é errado classificar a água, como muitos livros didáticos ensinam, como um recurso renovável. "Recurso renovável é aquele que, ao ser utilizado, tem a capacidade de recuperar seus estoques por mecanismos naturais, como no caso das florestas. Bem diferente da água, já que as suas quantidades são estáveis no  Planeta. A molécula de água não se destrói com o uso e sempre acaba voltando para o sistema, ainda que em outro estado, de modo que sempre apenas 'emprestamos' água do ciclo hidrológico".

Isso não significa que devemos desperdiçar este recurso. Ao contrário, uma vez conscientes de que captar, tratar e distribuir água é caro, devemos ter a noção da importância de economizarmos este importante recurso para a vida. E mais. Pouco se fala em desperdício qualitativo. Como as casas não recebem água de reuso, a mesma água que se bebe se usa para dar a descarga. Um absurdo. Cerca de metade dos usos domésticos não necessitam de água potável.

Fonte: USP
Foto: Internet

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