E embora as religiões sejam, muitas vezes, contestadas e acusadas de fundamentalismo ou irracionalidade, o mundo nunca esteve tão dependente de suas doutrinas. Segundo relatório de 2013 do Center of the Study of Global Christianity, ligado à Universidade de South Hamilton, em Massachucets, nos Estados Unidos, 88% das pessoas do planeta se declararam adeptas de algum culto religioso.
Para tentar entender este fenômeno, o Grupo de Estudos de Retórica e Argumentação, o Gerar, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, FFLCH, da Universidade de São Paulo, organizou no último dia 14, o seminário Discurso Religioso: Possibilidade Retórico-Argumentativas, a fim de buscar respostas para descobrir o que leva as religiões a angariarem tantos seguidores. Que elementos textuais estão presentes em suas doutrinas?
Para o professor Paulo Augusto de Souza Nogueira, da Universidade Metodista de São Paulo, a religião representa um novo sistema de linguagem. Ela cria seus próprios conceitos e se torna uma segunda linguagem que molda o mundo. O professor compara o discurso religioso a temáticas culturais como cinema, teatro e poesia, que também tem status de linguagem. Uma vez atingido esse status, o discurso religioso ganha o poder de articular e moldar a visão das pessoas. E se aproveitando desse discurso, "os religiosos procuram legitimar a ocupação religiosa do espaço público e da esfera pública", apontou, enfatizando que os grupos seculares defendem a rigorosa separação entre Estado e igrejas.
O professor Isaar Soares de Carvalho, doutor em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas, a Unicamp, ao comentar sobre a relação entre a religião e o Estado, mostrou como aspectos do discurso religioso podem ser usados como forma de legitimação do poder. Como exemplo, cita o filósofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679), que buscou nas Escrituras Bíblicas argumentos que validem o absolutismo.
Capacidade de convencer
"Quem fala vai escolher os recursos apropriados", diz Lineide |
Mas para que a mensagem do pregador contagie de fato o público, este deve, antes de tudo, ser receptivo ao que está sendo dito. "Em qualquer tipo de discurso, toda a estratégia é feita no sentido de que o receptor aceite. Mesmo no discurso da Ciência, o cientista tem que convencer os seus pares", acredita a fundadora e coordenadora do Gerar, a professora Lineide Mosca. Para ela, o auditório é um dos aspectos mais importantes da pregação. É uma peça sem a qual não há nenhum discurso. Como exemplo, a professora apresenta Padre Vieira e Santo Agostinho, grandes pregadores que possuíam o dom de contagiar os ouvintes, utilizando-se da retórica e dos recursos da ação.
E em se tratando de retórica, a coordenadora do Gerar diz que o senso-comum enxerga a retórica como sinônimo de belos discursos e de falas difíceis, o que é uma visão errônea. Porém, nem sempre a fala atinge completamente seu objetivo. "Quando a gente fala de retórica, fala de convencimento e persuasão. Você pode convencer, mas pode não ter conseguido persuadir", avalia. Persuasão é quase sinônimo de adesão. Por isso, as doutrinas, na tentativa de convencer os ouvintes, não trabalham apenas no sentido de agregar seguidores. O pregador tem essa convicção de que o que prega é bom para todos. A retórica e a argumentação são elementos essenciais para a construção de opiniões e a saudável troca de ideias. Todas as questões são polêmicas. Por isso, o lugar próprio da argumentação é o lugar da controvérsia, porque onde há consenso absoluto não há necessidade de argumentação.
Algumas leis propostas pelos evangélicos Brasil afora, segundo o blog Permanecer e Compartilhar
- Lei da Calcinha - obriga as noivas a se casarem com a roupa íntima e regula o decote do vestido (Vila Velha - ES)
- Lei do Pai-nosso - obriga professores e alunos a orar antes do início das aulas na rede pública (Ilhéus - BA)
- Não beberás - proíbe a existência de bares a menos de 300 metros de uma igreja para garantir a paz dos cultos (Sorocaba, SP)
- O púlpito é pop - Declara o púlpito evangélico um patrimônio imaterial da cidade (São Paulo - SP)
Fonte: Site da USP
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