segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Quando o doente é o médico

Suicídio entre os médicos é uma ocorrência comum. A
depressão é uma das principais causas
      O que você vai ser quando crescer? A pergunta, ainda que em tom despretensioso, é feita por adultos quando em contato com uma criança; muitas vezes como forma de iniciar uma conversa. Sem saber, esse hábito já estimula a criança, desde cedo, ter em mente que a escolha da profissão é uma momento importante para ela. Até chegar na fase adulta, várias serão as áreas pelas quais ela irá demonstrar interesse ao longo de cada fase da vida. Muitas vezes até por influências de terceiros, que ditam suas preferências, teorizam sobre profissões viáveis e oportunas e pré-julgam aquelas que passam menos status. 

      E quando chega o momento da escolha, o que menos pesa - porém o que deveria ser o fundamental - é se o candidato realmente sente-se atraído afetivamente pela área escolhida. Para isso, é importante tentar buscar respostas para questões que vão muito além do retorno econômico que a profissão poderá render ao futuro profissional.

      Ainda no topo das escolhas, para muitos a Medicina é uma área que continua despertando interesse, além de sinônimo de status. Alguns pais sentem-se aliviados por conseguirem tirar do filho a opção por uma área "com menos glamour", digamos assim, que ele desejava há tempos. Médico ganha bem, professor passa fome. Focados no aqui e agora, de fato eles têm razão; mas intimamente, o filho não tem tanta certeza.

       A incerteza na escolha, somada à falta de visão da profissão, podem ser uma das razões pelas quais o suicídio entre os médicos é muito comum. É preciso entender a área médica como um todo. A falta de cuidado com a saúde mental leva médicos à depressão, dependência química e ao suicídio.

      No livro Médico como Paciente, a autora em psiquiatria Alexandrina Meleiro acredita que a autossuficiência é a palavra que pode sintetizar a dificuldade que o médico tem de procurar ajuda quando adoece. "Sentimentos como onipotência e vergonha fazem com que muitos profissionais assumam a automedicação. As consequências são variadas, mas quando o assunto é saúde mental, vemos a categoria amargar incidência alta de dependência química, depressão e taxa de suicídio", afirma a autora e membro da Associação Brasileira de Psiquiatria e coordenadora da Comissão de Estudos e Prevenção de Suicídio da ABP, e também membro do Grupo de Atenção da Saúde Mental do Médico.

      Para o coordenador da Comissão de Atenção à Saúde Mental dos Médicos e membro emérito da Academia Mineira de Medicina,  José Raimundo da Silva Lippi, a falta de condições de trabalho, excesso de carga horária, tensão da relação médico-paciente, são alguns dos fatores que aumentam a vulnerabilidade do médico em relação a outras profissões. "É alguém que convive com a frustração de não ter conseguido salvar uma vida. As vezes, por imaturidade ou por se considerar um 'semi-deus' sofre mais do que os outros", avalia. De acordo com  ele, a depressão é a doença mental mais comum entre a classe. A autora do livro chama a atenção para um problema ainda maior. "Os médicos se suicidam  cinco vezes mais que a população em geral. Os mais vulneráveis estão na faixa etária de 35 a 50 anos.

Versões para o suicídio

     De modo geral, o suicídio é um tema tão complicado que é estimado um número duas ou três vezes maior em razão da subnotificação ao registrar a causa da morte. Quando uma pessoa comete um suicídio, existe uma tendência entre os médicos não registrar o suicídio como causa da morte. Geralmente registra-se a causa externa da internação, como por exemplo, queda de altura, envenenamento, intoxicação exógena (excesso de remédios). Segundo Alexandrina Meleiro, a razão por essa subnotificação pode ser também em razão dos seguros de saúde e de vida não cobrirem situações de ato voluntário contra a própria vida.

      No entanto, um levantamento de atestado de óbitos feito pelo Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, o Cremesp, mostrou que quando a profissão da vítima era a medicina, a palavra suicídio aparecia. Uma das hipóteses é que, por se tratar de um colega, o rigor da notificação é maior.

Realidade norte-americana

      Segundo a Fundação Americana para a Prevenção do Suicídio, 300 a 400 médicos cometem suicídio a cada ano, cerca de um médico por dia. A formação médica envolve inúmeros fatores de risco para a doença, tais como  transição de papéis, diminuição do sono, traumas, mortes, doenças, tragédias e muitos outros acontecimentos inerentes à sua vida profissional. Um conjunto de testes demonstrou que a residência médica, os estágios e outras formas de treinamento médico, são de alto risco no que concerne a depressão e pensamentos suicidas.

      Todas as profissões têm seu "lado B". Analisar e estudar as várias questões que envolvem a área pretendida pode prevenir frustrações futuras. 

Fonte: Sites UAI



     

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