A cor na flor da vida morta nas mãos do Pierrô/ Foto: Brazillian Voice |
Era para ser um texto alusivo ao Carnaval. Era para ser Carnaval. É Carnaval. Mas não há riso, nem alegrias. O mundo assiste com aflição ao ataque militar da Rússia na Ucrânia, e consequentemente os possíveis desdobramentos geopolíticos. Por enquanto, o que se sabe é que já há centenas de mortos, entre militares e civis. Há também medo e desespero. Ucranianos deixam suas casas em busca de refúgio, brasileiros que por lá residem andam milhares de quilômetros para cruzar fronteiras e chegar a um país onde seja possível voltar para o Brasil. Os palhaços em seus salões palacianos torram bilhões de dólares com mísseis, enquanto que bilhões de pessoas ainda passam fome no mundo.
Choram o Arlequim e a Colombina, chora o planeta Terra que respira o combustível que sai do fogo que queima suas florestas, que lamenta seus animais extintos. O homem que diz querer beijar agora o outro homem olha a sua volta e vê a máscara negra do ódio homofóbico a apontar-lhe a arma no meio da rua.
É Carnaval. Mas não há o riso, nem alegrias porque o rapaz que corre é parado pelo outro homem fantasiado de polícia que saca do coldre a arma que lança nele o perfume racista da morte.
Os mortos da Ucrânia somam-se aos mortos de Petrópolis e estes aos mortos da pandemia, todos pertencentes à espécie que está muito longe de extinção, é a que mata e se mata. Há tempos tive um sonho, não o de Lennon, e nem o de Luther King. Em meu sonho, os vivos reverenciavam os mortos, e em seguida os convidavam para bailarem juntos uma valsa triste de Chopin. Em algum momento daquela dança eu despertei com a crença de que no bailado da vida a morte não usa máscaras, é visível para aquele que a reverencia, e que a partir dela percebe que viver é mais que uma passagem de tempo musical, mas também uma dança de incorporar o outro em você, percebendo que a dor do outro em você também deveria doer.
Portanto, não faça guerra, ame. E beijar agora por ser Carnaval o outro poderá não levar a mal, conquanto que haja a devida permissão, evidentemente.
Texto: Elisa Marina