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Representando o Brasil, Mauro de Oliveira abordou os impactos das redes sociais na vida dos usuários/ Foto: Arquivo Pessoal |
Pedindo licença a William Shakespeare para extrair de sua peça,
A
tragédia de Hamlet, a frase mais famosa e enigmática para pensar a
profissão de jornalista e um receio em exercê-la frente a constantes ataques
de governos autoritários, é o caso de se pensar, caros jornalistas, ser ou não ser? O mais
recente caso deixa bem claro esse contexto. No último dia 13 de maio, o exército de Israel
invadiu o funeral da jornalista palestina Shireen Abu Akleh e derrubou seu
caixão no chão. Executada com um tiro no rosto enquanto exercia a profissão,
Shireen não teve direito nem a um funeral digno.
A credibilidade do que se escreve e sobre quem se escreve é questionada, quando não, ameaçada. E como se não bastasse tudo isso, este profissional ainda
vê suas matérias competirem de igual com conteúdos falsos ou equivocados,
popularmente conhecidos como fake news,
cujos propósitos são alarmar a sociedade, massificar a desinformação, produzir
o caos a fim de atrair seguidores para os interesses de quem os divulga.
Um exemplo clássico foram as mentiras criadas em torno da vacina para a
Covid-19, mesmo com todas as evidências científicas comprovadas com relação as suas eficácias, e sem efeitos graves. Muitos recusaram o imunizante por "ouvirem dizer que os efeitos colaterais seriam danosos ao organismo".
O jornalismo tem como objetivo a investigação e apuração dos
fatos, e o que daí for extraído torná-lo público. E quando o exposto é aquilo o
que se pretendia esconder, o jornalista vira ele próprio notícia do jornalismo.
Somente no Brasil, os ataques a profissionais do setor possuem números
significativos, foram 430 ocorrências ao longo de 2021, segundo a Federação
Nacional dos Jornalistas, com base na pesquisa do Programa de Pós-Graduação em
Ciências da Comunicação da ECA/USP, em parceria com diversas instituições
internacionais.
A violência contra o jornalista e a desvalorização do
profissional criaram uma atmosfera de desinteresse para atrair novos
candidatos, e sendo assim qualquer um que cria um blog se sente autorizado a se
autodenominar jornalista, como se para isso bastasse apenas saber escrever, ou
se posicionar bem a frente das câmeras. Para o mestre e doutor em Administração e
Marketing pela FEI, jornalista e matemático Mauro de Oliveira, à frente da
agência de comunicação Noticiando, e pesquisador associado da FEI, onde publica
artigos e pesquisas científicas, como também em jornais internacionais, inicialmente
é preciso entender que a profissão de jornalista sofreu um duro impacto com o
fechamento das redações, principalmente da mídia impressa, e como consequência
o desemprego para a categoria só aumentou. E mais, a informação na era digital se
aproxima mais de um mundo sustentável. A produção de jornais e revistas em
papel, além de tudo, é mais cara. E o impacto negativo é que a qualidade na
apuração dos fatos ficou posta em cheque, sobretudo porque muitos sites passaram a trabalhar com
poucos jornalistas, logo o release [texto enviado pelo assessor de imprensa ao
jornalista como sugestão de pauta] que o assessor de imprensa encaminha para
determinado veículo vira a própria matéria daquele site. Para ilustrar a tragédia, Oliveira relembra uma ocasião em que começou a receber muitas
ligações com pedidos de emprego, o que lhe causou certa estranheza. Acontece
que o seu release, que continha seus dados, fora publicado na íntegra, sem que
ao menos o profissional da redação se desse ao trabalho de retirar o número de
celular do assessor de imprensa, no caso, Mauro de Oliveira, que faz assessoria de imprensa para o Núcleo Brasileiro de Estágios, o Nube – Estagiários e Aprendizes.
Pavor de textão
Ao contrário do que dizem por aí, o brasileiro lê. Contudo, a
dúvida é o que os leitores brasileiros estão consumindo? Uma característica interessante é a aversão que muitos têm a textos longos, o famoso textão. Logo, notícias
que requerem um trabalho de apuração maior, como estudos econômicos, dados
trabalhistas, por exemplo, e que impactam diretamente a vida cotidiana das
pessoas, rendem textos muito longos, o que acaba por desanimar o leitor.
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A Satisfação com a Vida Influencia o Uso do Facebook (tradução ao tema da palestra de Mauro de Oliveira, na conferência internacional |
Não por acaso, no ranking das matérias mais lidas nos
principais portais de notícias, os conteúdos classificados como "fofocas" aparecem no topo. Mauro de Oliveira
entende esse fato como um cansaço com informações, digamos assim, mais pesadas.
As pessoas querem aquilo que irá lhes trazer leveza. É como se a dureza da
vida fosse diluída com a leitura de um texto sobre, por exemplo, o vestido caro
da cantora famosa, observa o professor. E isso se reflete até mesmo nas redes
sociais, conforme comprova sua tese de doutorado, quando revela que “a
satisfação com a própria vida aumenta o engajamento nas redes sociais”, ou
seja, aquele que posta conteúdos felizes quer mostrar ao mundo que se é realmente
feliz.
Com mais de vinte e cinco anos de profissão, Mauro de
Oliveira se mostra feliz como jornalista, sem que para isso tenha que ter o
aval de uma rede social. Discreto, publica pouco sobre sua vida pessoal, mesmo
quando posto em momentos impagáveis, como quando, em 2018, ao retornar de uma
viagem à China, depois de participar como convidado do governo de lá para
representar o Brasil em uma conferência internacional de Gestão e Marketing, somente
soube que Jair Bolsonaro havia sido eleito presidente do Brasil pelo taxista do
Aeroporto de Guarulhos. Oliveira ficou no país asiático por cerca de um mês, e
como as notícias por lá eram divulgadas apenas em chinês, idioma que ele não
domina, e o acesso a redes sociais, proibido, ficou impossível acompanhar o
embate político entre esquerda e direita que ocorria no mundo virtual. Foi
então que ele, como cidadão, entendeu e percebeu o quanto é fundamental estar
informado. Por isso, avalia, a profissão de jornalista nunca estará ameaçada
de extinção por uma razão simples: por mais que haja redes sociais, a imprensa
ainda tem credibilidade, e é ela que sempre estará no local dos fatos
realizando o indispensável trabalho de apuração, a fim de levar a notícia ao
cidadão que realmente quer a informação, conclui.
Texto: Elisa Marina - jornalista